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  • Miúcha: “Ensinei o Chico a tocar violão”

    Agenda Bafafá em 04 de Fevereiro de 2021    Informar erro
    Miúcha: “Ensinei o Chico a tocar violão”

    Irmã de Chico Buarque de Holanda, Miúcha aprendeu a tocar violão com Vinícius de Moraes, que frequentava sua casa em São Paulo, onde morou a partir dos oito anos de idade. O pai, Sérgio Buarque de Hollanda, era amigo de músicos e gostava de promover saraus e noitadas musicais que reuniam também Dorival Caymmi.
     
    Acabou ensinando Chico Buarque a tocar o que tinha aprendido com o Vinícius. Aos 23 anos foi estudar História da Arte na Sorbonne, em Paris e passou a se apresentar em bares da capital francesa, entre eles o La Candelaria, onde conheceu João Gilberto.
     
    Foi amor fulminante. Ele voltou para os EUA onde ela se juntou no ano seguinte para se casar. Da relação nasceu a hoje também cantora de sucesso Bebel Gilberto. O primeiro disco saiu em 1975, em Nova Iorque, intitulado "The Best of Two Worlds", com João Gilberto e Stan Getz. Em 1977 participou do famoso show no Canecão ao lado de Vinícius, Toquinho e Tom, que rendeu um disco histórico. Com mais de 30 anos de carreira, Miúcha já gravou 10 discos solos e outros tantos em parceria.
     
    Em entrevista exclusiva ao Bafafá, Miúcha fala sobre sua infância e adolescência, o primeiro contato com a música, Bossa Nova e sobre política. A artista confirma que Tom Jobim estava no antigo Bar Veloso (hoje Garota de Ipanema) quando recebeu um telefonema de Frank Sinatra para gravar em parceria. “Quando o telefone tocou, as pessoas falaram que era trote e Tom ficou na dúvida”, assegura.
     
    Como foi sua infância? 
    Nasci no Rio e me mudei para São Paulo com oito anos de idade. Fiquei lá até 23 anos, quando fui para a Europa, onde morei sete anos sem vir ao Brasil. No total passei 13 anos fora. Fui criada com muita música dentro de casa. Vinícius sempre aparecia e me ensinou a primeiras harmonias do violão. Em todos os lugares que moramos meu pai promovia encontros musicais.
     
    Todo o mundo tinha talento musical em casa?

    Quem cantava mesmo era o Chico e as três irmãs mais moças: Maria do Carmo (piii), Ana de Holanda e Cristina Buarque. Sou a mais velha e ensinei o Chico a tocar o que tinha aprendido com o Vinícius.

    A partir de que momento soube que a música seria a sua vida?                                                            Sempre soube, mamãe não achava graça em nenhum de nós fazer música. Pagou pela língua. Fui estudar em Paris e levei meu violão e tocava em bares e com amigos da Sorbonne. Conheci o João Gilberto num bar em Paris chamado La Candelaria, no Quartier Latin, onde cantava a chilena Violeta Parra. Foi amor fulminante. Ele voltou para os EUA onde o encontrei e me casei. Tive a Bebel, nascida em Nova Iorque. O primeiro disco. O primeiro saiu em 75, em Nova Iorque, intitulado "The Best of Two Worlds", com João Gilberto e Stan Getz. No mesmo ano participei do disco “Urubu” de Tom Jobim e participei do “Saltimbancos” com o Chico. Em 77, gravei o primeiro LP: “Miúcha e Antônio Carlos Jobim. No mesmo ano, fiz um show no Canecão ao lado de Vinícius, Toquinho e Tom, que rendeu um disco histórico. O espetáculo ficou em cartaz no Rio por quase um ano, seguindo depois para outras cidades na América do Sul e Europa.

    A Bossa Nova foi obra de quem?    

    A forma é obra de João Gilberto. Tom e Vinícius compuseram “Chega de Saudades”, que foi gravada pela Eliseth Cardoso e João Gilberto no ano seguinte e estourou. O João aplicava estilos novos em composições de Ari Barroso, Dorival Caymmi, Geraldo Pereira, que não eram dessa época. A partir daí se criou a idéia desse novo movimento e o Tom passou a compor para esta harmonia letras como “Desafinado” e “Samba de uma nota só”.

    Até então prevalecia o canto lírico?
    Era empostado, bem derramado. As letras eram melodramáticas. Isso mudou muito com o João. O Vinícius trouxe uma maneira coloquial, introduziu um outro elemento. O Tom sempre negou que a Bossa Nova veio do Jazz. Para ele era Samba. A Bossa Nova é que teve uma grande influência no Jazz. Até hoje se usa este estilo no Jazz.

    Como o João começou na música?
    O João começou a tocar violão com 20 e poucos anos, quando fazia parte de um conjunto vocal. Ele não tinha emprego e foi morar na casa da irmã Dadainha em Lavras de Diamantina, em Minas. Ficou pouco tempo, uns dois meses. Ele precisava de colo, carinho da irmã. Depois retornou ao Rio e quando Tom o ouviu pela primeira vez ficou encantado.

    Confere que Sinatra procurou o Tom no antigo bar Veloso, atual Garota de Ipanema?
    É verdade. Primeiro descobriu o telefone do bar na casa do Tom. Quando tocou, as pessoas falaram que era trote. Tom ficou na dúvida. Era um convite para gravar um disco em inglês e português, e entre outras músicas, Garota de Ipanema. Isso mostra a deferência que Sinatra tinha pelo Jobim. “Garota de Ipanema” ficou entre as mais tocadas, superando até os Beatles. O disco vendeu uma loucura e foi o primeiro sucesso da Bossa Nova nos EUA.

    O que está achando da música brasileira atual?
    Acho que estamos num impasse engraçado. Os meios de comunicação privilegiam músicas descartáveis feitas com dois ou três acordes e ênfase na batida, no pancadão. Hoje em dia surgiram muitas escolas de música. Vemos muitos jovens com menos de vinte anos estudando chorinho, samba. É uma volta cíclica. O Brasil inteiro tem interesse por isso. Fico impressionada com a quantidade de jovens que conhecem as músicas do Tom e do Chico. Estão voltando para beber em outras fontes, dentro da própria música brasileira. Tocar Pixinguinha e samba de raiz é difícil.

    Pode surgir algum estilo novo, contagiante como a Bossa Nova?
    Tudo pode. Tem muita gente boa fazendo coisa boa. Até o funk que vem do povo é uma expressão legítima apoiada na letra. A Bossa Nova pode ser lida e interpretada de várias maneiras, com várias leituras. O samba é riquíssimo. Quando for reinventado um novo estilo eu te digo (riso).

    Outubro de 2006

    Entrevista concedida a Ricardo Rabelo.



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