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  • Chico Chico: A gente se presenteia com a vida

    Da Redação em 06 de Maio de 2016    Informar erro
    Chico Chico: A gente se presenteia com a vida

    O jovem cantor Francisco Ribeiro Eller, o Chicão, filho da cantora Cássia Eller, tem um vozeirão que lembra a mãe e já desponta como uma das revelações da nova safra da MPB. Acaba de lançar o primeiro CD com sua banda 2 x 0 Vargem Alta, e recentemente se apresentou no Circo Voador com lotação esgotada. Com apenas 21 anos, Chicão é também ativista social preocupado com as mazelas da sociedade.  

    Em entrevista ao Bafafá, com o nome artístico de Chico Chico, ele fala sobre os primórdios na música, a arte de compor (é autor de 30 composições), inspiração, conjuntura política e muito mais. Questionado se tem algum recado para os que pedem o impeachment de Dilma, dispara: "Leiam As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano". Sobre o governo, alfineta: “A verdadeira crítica ao PT tem de ser mais à esquerda, não à direita”. Sobre a vida, filosofa: “Estar vivo é uma coisa muito grandiosa. A gente se presenteia com a vida”.

    Como a música aconteceu?

    Ouvindo e indo a shows da minha mãe. Além disso, tinha muitos instrumentos em casa (riso). Tive aula de violão popular dos 15 aos 17 anos. Depois disso fui tirar as músicas que eu gostava. Na verdade eu uso o instrumento para compor, não sou nenhum virtuoso. Ele é mais uma ferramenta. Toco um pouco de pandeiro também.

    Quando toca violão, transcende?

    Sim, em alguns momentos você sai dali com a música. É uma sensação prazerosa e confortável.

    Chegou a trabalhar a voz?

    Nunca fiz aula de canto, nem cantei em coral (riso). Mas, acho maneiro. Eu gosto de falar as coisas que eu sinto e poder compartilhar com as pessoas. Independente ou não de ser um grande cantor. Dizem que eu tenho um tom parecido com o da minha mãe. Mas, a gente fala parecido com os nossos pais. Eu vim dela, né? Não canto como ela. O timbre pode parecer. Ela cantava muito melhor.

    Como começou a se apresentar em público?

    Tive algumas bandas, comecei aos 15 anos com a Zarapatel e a Uzoto, tocando repertório autoral de rock e pop. Na atualidade, tocamos juntos em bandas diferentes (riso). Hoje toco e canto na banda 2 x 0 Vargem Alta que acaba de lançar seu primeiro CD. A maioria das músicas é autoral, entre elas, As Folhas da Praça Paris, que vem agradando muito.

    E a arte de compor?

    Gosto de escrever em cadernos. Gosto de falar do dia a dia, as coisas da cidade, as angústias, o que a gente não consegue expressar. Devo ter composto umas trinta músicas. Do meu CD, 10 músicas são minhas.

    Você prioriza o coletivo ao individual?

    Sim, mas com individualidade também (riso). Mas, não gosto de ser líder não.

    Consegue conciliar a faculdade de geografia na UFF com a música?

    Estou fazendo aos poucos, mas esse semestre teve greve e sou passei em uma matéria. Vou para lá de bicicleta e barca. O cara que hoje reclama da universidade pública geralmente veio da escola privada. Para mim nunca faltou nada. Falta apenas mais inclusão, apesar de isso já estar rolando.

    Como está vendo o momento político brasileiro?

    Acho muito louco esse movimento todo de direita botando a cara mesmo. É triste ver o nível do preconceito de algumas pessoas e a falta de entendimento com o próximo.

    Como explica essa onda de conservadorismo?

    Os últimos 12 anos de governo do PT incomodaram muita gente. Tivemos muitos avanços, mas as mudanças precisam ser mais radicais. A direita se une muito mais fácil que a esquerda. A verdadeira crítica ao PT tem de ser mais à esquerda, não à direita. Acho por sua vez patético ver os coxinhas protestando em passeata de carro, como vi em Belo Horizonte. Esse é o tipo de gente que protesta (riso). Se eu tivesse que dar um recado para um coxinha eu dava o livro “As Veias Abertas da América Latina”, do Eduardo Galeano (riso). Esse pessoal só se informa com o que quer, não aceita argumentos.

    Você acha que a Dilma é corrupta?

    Acho que não, as coisas não passam diretamente por ela. A questão não é a pessoa, é a estrutura de poder que é assim.

    Você é um cara de esquerda?

    Sim, claro (estufando o peito). Não sou filiado a nenhum partido, mas tenho identificação com o PSOL. Gosto muito quando encontro o deputado Chico Alencar, um cara legal de conversar, acessível.

    Você tem um sonho?

    Quero ficar tranquilo. Não quero ser famoso, quero tocar e ser escutado (riso). Quero que conheçam a minha música. Acho irado, já criaram até um fan club. Pelo menos até agora tá bem pacato. 

    Por que o nome artístico Chico Chico?

    É um nome que achei sonoro, gostei. Não tem nada de numerologia. Interessante é que fica gravado na cabeça das pessoas. Chicão é um nome comum, sem muito apelo.

    Na MPB, quem são teus maiores inspiradores?

    O Jards Macalé e o Luiz Melodia são meus deuses! Eles são fodas, adoraria cantar com eles um dia. Gosto de tudo na MPB. Caetano, Chico, Carlos Pousada, Júlia Vargas, ela canta demais, puxa também para o rock.  

    Quais estilos gosta?

    Gosto muito de rock, mutantes, Raul Seixas, Alceu Valença.

    Tem religião?

    Acredito nas pessoas, nas relações. Não sei sequer rezar o Pai Nosso. Mas, ainda assim, acredito que tenha algo maior do que a gente. Estar vivo é uma coisa muito grandiosa. A gente se presenteia com a vida.

    Acredita em reencarnação?

    Não. Acho que a gente ilumina os outros, mas com a força da vida. Não que a morte signifique o fim; as memórias nos eternizam.

    O que mais admira na vida?

    As amizades, os encontros, as possibilidades que os outros representam. A solidão é importante, cada um lhe dá de seu jeito. É bom ter os dois, amigos e solidão.

    O que mais abomina?

    Machucar os outros por falta de tato. A dificuldade das pessoas se colocar no lugar do outro. Temos que estar sempre dispostos a entender os demais e a dar um abraço se necessário.

    Qual é teu time?

    Vascão (riso). De coração!

    O filme sobre a tua mãe (Cássia Eller) foi fiel?

    É uma visão legal, sincera. Não distorceu nada da vida dela!

    E os projetos?

    Tocar muito, gravar. O primeiro CD 2 x 0 Vargem Alta pode ser comprado no site da Coqueiro Verde e baixado pelo gratuitamente pela Internet. Se a pessoa quiser o CD pode encomendar.

    Qual é o recado que você daria para a sua geração? 

    Difícil essa pergunta (riso). Meu recado é não escutem meu recado, façam o que quiserem.

    Gosta de cinema?

    Gosto de filmes iranianos como Uma Garrafa no Mar de Gaza e do Woody Allen. Não sou muito cinéfilo, se me derem umas dicas eu vou atrás (riso).

    Pretende ter filhos?

    Algum dia, até mais de um seria legal. Queria sentir essa emoção de ser pai, deve ser legal.

    Tem alguma utopia?

    De poder mudar esse mundo, ganhar dinheiro sem me curvar aos outros. Quero também justiça social, que as pessoas se respeitem.

    Novembro de 2015, entrevista concedida ao editor do Bafafá Ricardo Rabelo.


    ÁUDIOS

    Chico Chico: "A gente se presenteia com a vida"


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