O Festival Interativo Música e Arquitetura, em homenagem aos 458 anos da cidade do Rio, reunirá musicistas tarimbados com participação do diretor do museu, comentando a história do monumento arquitetônico e promovendo uma visita guiada.
O concerto começa celebrando o jardim realizado, no tempo do Barão, pelo paisagista francês Auguste Marie François Glaziou e remodelado para a sua ocupação pela sede do Poder Executivo Nacional por seu discípulo Paul Villon. Os movimentos Le jet d'eau e Recueillement da obra "Cinco Poemas de Baudelaire", de Claude Debussy, e As Ninféias do ciclo "Os Olhos de quem vê", de Pablo Castellar, irão dialogar com o jardim, seus pequenos lagos e o belo chafariz que representa o Nascimento de Vênus realizado na França pela Fundição Val D´Osne.
Em seguida, o programa chega a Heitor Villa-Lobos, compositor que durante o regime de Getúlio Vargas implementou um programa de educação musical nas escolas. Neste momento, é lembrado o complexo contexto sociocultural brasileiro do início do século XX, no qual a ideia de modernidade e a invenção da nação se misturavam.
Na obra "Suite Para Canto e Violino", expressa-se a personalidade musical singular do compositor que ligado às experimentações traz uma visão musical particular do Brasil. No terceiro e último movimento, Sertaneja, as onomatopeias aparecem como recursos musicais para reforçar o ambiente rural/tradicional, seja com o som da rabeca, de danças sertanejas, do galope da boiada ou de tiros de espingarda. Tiros que talvez ecoem o disparo desferido por Getúlio contra o próprio peito.
Para celebrar o Salão Mourisco, com sua decoração inspirada na arte islâmica, o trio irá apresentar Sheherazade, de Rimsky-Korsakov, que conta a história da lendária rainha persa que fascinou e ganhou o eterno amor do Rei Shariar ao narrar fantásticas histórias por mil e uma noites. Já no Salão de Banquetes, também utilizado por Getúlio Vargas como um espaço para suas reuniões ministeriais, destacam-se no teto estuques com frutos e nos arcos pinturas de naturezas mortas, do italiano Domenichino. Momento em que o programa busca refletir a beleza vegetal e o estilo barroco através da ária Ombra mai fu (Nunca houve uma sombra), da ópera Xerxes.
Para dialogar com cenas mitológicas que encontramos no primeiro andar do palácio e que copiam os afrescos pintados pelo renascentista italiano Rafael (1483-1520) na Villa Farnesina e a cópia em metal da escultura Afrodite de Cápua, que se encontra no Museu Nacional de Nápoles, segue o lamento de Dido, When I am laid in earth (Quando eu descer à terra), de Dido e Enéias, ópera de Henry Purcell que retrata o amor da rainha de Cartago, Dido, pelo herói troiano Eneias. Na Ilíada de Homero, Eneias é o guerreiro favorito de Apolo, o que nos permite também com essa música fazer uma alusão à Troia, representada nas cenas da vida de Apolo que encontramos no friso do Salão Nobre.
Subindo para o segundo andar, observam-se os vitrais de sua galeria que representam musas e outras figuras mitológicas, trazendo a ária cantada pela Ninfa aquática "Rusalka", que dá nome a ópera Antonín Dvořak, intitulada A Lua. Em seguida, uma celebração ao Salão Veneziano, local onde se realizavam as apresentações musicais deste palácio. Seu nome decorre do estilo do mobiliário, com móveis pesados e ricamente decorados. Foi neste espaço que ocorreu o polêmico sarau com músicas da compositora e maestrina Chiquinha Gonzaga, promovido pela primeira-dama do presidente Hermes da Fonseca, D. Nair de Teffé. Nele foi apresentada a obra Corta-Jaca, que escandalizou a sociedade da época.
O concerto chega ao fim com Ich bin der Welt abhanden gekommen, de Gustav Mahler, novamente lembrando Getúlio Vargas com esta obra que evoca a paz alcançada pelo fim de uma vida em meio à turbulência do mundo. Da mesma forma vemos isso refletido nas palavras perpetuadas ao fim da carta testamento Getúlio, "...Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história." Na música vemos os aspectos mais importantes da existência do autor: seu céu, sua vida e sua canção. Um isolamento e uma desolação que se transformam em paixão quando o poeta se declara morto para o mundo.