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  • Alceu Valença, o embaixador do frevo

    Agenda Bafafá em 14 de Setembro de 2018    Informar erro
    Alceu Valença, o embaixador do frevo

    O cantor Alceu Valença é apontado como o “embaixador do frevo” no Rio de Janeiro. Radicado na Cidade Maravilhosa desde o início dos anos 70, o artista pernambucano gravou mais de 30 discos, sempre destacando os acordes musicais de sua terra natal. Com agenda cheia - chega a fazer mais de 100 shows por ano – Alceu acaba de lançar o novo álbum “Amigo da Arte” (Deck) que reúne frevos, maracatus, caboclinhos e cirandas. No disco, ele apresenta um panorama da folia de Olinda e Recife e destrincha o frevo em todas as suas vertentes. “O carnaval pernambucano é absolutamente múltiplo”, assegura.
     
    Em entrevista ao Bafafá, Alceu Valença fala sobre a sua carreira, a música pernambucana e a decadência das gravadoras. “Elas estão no último suspiro por incompetência. A revolução está acontecendo pela Internet, mas é preciso saber usá-la”, alfineta. Sobre o carnaval de rua carioca, não titubeia: “O grande problema vai ser quando começar a botar trio elétrico. Em Recife e Olinda não tem”.
     
    Seu novo CD é um grande carnaval, né?
    Eu diria mais, é um múltiplo carnaval (riso). O carnaval pernambucano é absolutamente múltiplo com várias vertentes e raízes. Temos o frevo de rua (orquestras com metais), frevo canção (cantado), frevo de bloco (bandolins e cavaquinhos), ciranda, caboclinho de lança e o maracatu que tem duas vertentes, o negro e o indígena.
     
    Você sempre foi de brincar no carnaval?
    Quando pequeno, em Recife, a maioria dos blocos passava pela minha rua e éramos vizinhos do grande mestre do frevo Nelson Ferreira. Eu brincava carnaval para arrumar namorada, pois não dava para ficar todo suado e com ressaca à toa (riso). Na quarta de cinzas era terrível, a ressaca chegava a ser espiritual. Por sorte, neste dia, sempre chove em Recife e Olinda e acaba lavando tudo (riso). A natureza chora e lava a sujeira que as pessoas deixam nas ruas.
     
    E o projeto Asas da América?
    No final dos anos 70, o compositor Carlos Fernando da Silva inventou de fazer um projeto de revitalização do frevo para contrapor as rádios que estavam tocando música do sul (sudeste). Eu participei de todas as edições cantando com Geraldo Azevedo e Elba Ramalho, mas tivemos também convidados como Fagner, Jackson do Pandeiro, Chico Buarque, Lulu Santos, Gilberto Gil, Morais Moreira. Como era um projeto que deu grande visibilidade, as músicas começaram a tocar no carnaval e nos bares e passaram a fazer parte do repertório de Olinda. Até então eu não cantava no carnaval de Olinda, só ia lá para brincar carnaval.
     
    E o DVD Marco Zero?
    O DVD Marco Zero está disponível na íntegra no Youtube. Foi gravado durante uma apresentação em Recife para 160 mil pessoas. Era fora do carnaval e as pessoas foram fantasiadas.
     
    Faz quantos shows no carnaval?
    Faço dois shows por dia, em cidades até 100 km de Recife. Canto num lugar de tarde e em outro à noite. É meio maratona. No Rio, eu gosto de fazer os shows antes do carnaval na Fundição Progresso.
     
    O que difere o carnaval pernambucano com o carioca?
    Difere que o Rio tem o samba e nós temos o maracatu. São irmãos gêmeos. O Rio tem a marcha rancho que veio do frevo de bloco! As melodias são próximas. A marcha rancho não tem síncope. Não estou “pernambucanizando” nada, na verdade ela veio de Portugal (riso). A África nos deu o samba e o maracatu. A raiz do frevo são as bandas marciais, as polcas e a inventividade do povo pernambucano. O frevo é mais erudito que o samba, mais complexo.
     
    O samba não dá samba em Pernambuco?
    Pode até dar samba, mais do que o frevo aqui. Eu ouvi samba desde pequeno pela Rádio Nacional e conheço muitas músicas. As rádios do Rio é que não tocam frevo.
     
    As gravadoras estão no último suspiro?
    No último suspiro, por incompetência. A revolução está acontecendo pela Internet, mas é preciso saber usá-la. Meu disco está em primeiro lugar em downloads no iTunes na categoria MPB. A minha página no Facebook, lançada em janeiro, está com 700 mil seguidores. Eu mesmo interajo com os fãs em alguns temas, principalmente quando o assunto é de opinião.
     
    O que quer dizer com reciprocidade cultural?
    No Brasil deveria ter reciprocidade. O cara de Pernambuco ouvir a música gaúcha e vice-versa. O carioca ouvir som de outras regiões. Seriam espetáculos com verba pública para difundir os diferentes estilos. A migração para o Rio veio com a centralização da indústria fonográfica e televisiva na cidade.
     
    Você dança frevo?
    Não sou um grande dançarino, mas uns dois passos safados eu enrolo (riso). O frevo é toc, toc, toc. É pulando. Se botar para tocar num festival de rock está arriscado a todo mundo dançar (riso).
     
    Como está vendo a explosão do carnaval de rua carioca?
    O grande problema vai ser quando começar a botar trio elétrico (riso). Em Recife e Olinda não tem. O folião quer brincar sem um carro imenso a atrapalhar. O Rio está fazendo um carnaval lúdico, no meu último show na Fundição fiz questão de chamar a Orquestra Voadora e o Sargento Pimenta para se apresentar junto.
     
    Algum recado para os foliões neste carnaval?
    Que brinquem, pois a quarta-feira de cinzas está chegando! Acho que quatro dias está bom, senão já começa a fazer mal ao fígado (riso). Na verdade interessa muito mais a quem está vendendo a cerveja (riso).
     
    Tem alguma utopia?
    A minha utopia é a arte. Que as pessoas não sejam escravas da indústria do entretenimento, amigas da arte e não do dinheiro (riso).
     
    Entrevista concedida em 2014.
     
     


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