Promovido pela União Internacional de Arquitetos (UIA) desde 1948, o Congresso Mundial de Arquitetos ocorre pela primeira vez no Brasil.
Trata-se de um fórum privilegiado para profissionais e futuros líderes na arquitetura e em área afins. Um evento que debate o futuro das cidades e a cidade do futuro.
Os mais expoentes nomes da arquitetura e do urbanismo reunidos para analisar o panorama global e questões locais, formular propostas e apresentar soluções para melhoria da qualidade de vida e para um mundo mais justo e sustentável.
Em entrevista exclusiva à Agenda Bafafá Rio, Igor de Vetyemy, Presidente do IAB-RJ e Comissário-geral do 27º Congresso Mundial de Arquitetos UIA2021RIO fala sobre o evento.
Como o Congresso Mundial de Arquitetos vai enfrentar a pandemia?
Embora o enfrentamento da pandemia passe por uma questão imediata de posicionamento e esclarecimento, que faz parte do Congresso, num campo como o da arquitetura e urbanismo ele se configura muito mais como uma tarefa de longo prazo, porque o ritmo de efetiva materialização das reflexões que compõem este nosso campo é mesmo de longo prazo, não se reinventa as cidades de uma hora para a outra.
Mas existem momentos históricos em que o impacto dessas reflexões é muito mais intenso, necessário e urgente. Depois da revolução industrial, com todos os avanços tecnológicos que a época trazia, a resposta à pandemia da chamada gripe espanhola foi uma transformação completa do modo de se construir e de se fazer cidade, que veio com o Movimento Moderno e foi consolidado na Carta de Atenas.
Vivemos um momento com muitas similaridades, dada a recente revolução digital e a corrente pandemia de COVID-19. Em um contexto como este, juntar os profissionais vivos mais relevantes e premiados de todos os continentes (como Eduardo Souto de Moura, Carme Pigem, Kengo Kuma, Francis Keré, Marina Tabassum, etc) para refletir sobre o futuro da arquitetura e das nossas cidades se torna a tarefa mais relevante de enfrentamento aos efeitos da pandemia a que podemos nos dedicar.
A Carta do Rio, que será consolidada ao final do Congresso, será o nosso grande manifesto, uma apresentação dos acúmulos atuais e uma compilação de proposições para as cidades do futuro, que se tornará nossa grande contribuição com o enfrentamento dos desafios pós-pandemia. Essa é a principal contribuição que nós, como profissionais da Arquitetura e do Urbanismo, podemos oferecer para evitar que tornemos a chegar em uma situação extrema como essa no futuro.
Qual é a expectativa de comparecimento?
Com a necessária transformação do Congresso em um formato 100% digital, ele ganhou nova dimensão. Com a maior facilidade de alcance, a programação aumentou muito as contribuições de palestrantes de todos os cantos do mundo e já começamos a compartilhar conteúdos desde março.
Isso nos permitiu inclusive criar uma semana aberta por mês, gratuita e acessível a todos e todas. A partir dessa democratização de parte do conteúdo, atingimos uma participação nunca antes alcançada nesses mais de 70 anos de Congressos Mundiais de Arquitetura.
Entramos agora no mês de julho e já contamos com mais de 80.000 participantes de 195 países diferentes. Estamos chegando perto da parte mais intensa, propositiva e mais importante do Congresso, e ainda dá tempo de se inscrever em
www.uia2021rio.archi e participar deste, que é o primeiro sediado no Brasil e já é o maior Congresso Mundial de Arquitetos da história.
Onde será a sede do evento?
Com esse novo formato digital, o evento não tem exatamente uma sede física. Mas os arquitetos e arquitetas do Rio de Janeiro são os grandes anfitriões, que estão trabalhando há mais de 6 anos voluntariamente nessa construção, e diversas atividades foram pensadas para ancorar o evento em sua cidade-sede.
Afinal, o Rio de Janeiro não foi escolhido para sediar o 27º Congresso Mundial e se tornar a Primeira Capital Mundial da Arquitetura à toa. A ideia de o Congresso seguir acontecendo “no” Rio de Janeiro (com a cidade como estudo de caso para a reflexão sobre todas as cidades do mundo) não vem apenas do fato de a cidade ter um imenso patrimônio arquitetônico, com cinco séculos de arquitetura muito bem preservada, nem apenas por sua especial relação com a natureza, serpenteando entre o mar e as montanhas verdes.
O Rio também foi escolhido por ser uma cidade que incorpora e enfrenta os maiores desafios das cidades no novo milênio, especialmente a questão da desigualdade social e da injustiça espacial e urbana, que em nossa cidade se mostra tão palpável, tão exposta e tão urgente de ser resolvida. Nesse sentido, o Congresso abre espaço para lideranças políticas e artísticas desses territórios de favelas e periferias, mostrando que não são apenas espaços de escassez (de investimentos, de políticas públicas, de direitos), mas também espaços de muitos acúmulos (de criatividade, força de trabalho reprimida e de talento, sempre silenciado) e que tem muito a contribuir também com o desenvolvimento dos saberes da cidade formal.
Esse é um exemplo que precisamos dar a todas as cidades do planeta, de que toda essa potência precisa ser ouvida, em um necessário diálogo entre todos os mundos – um só mundo! Além disso algumas das exposições virtuais que estão sendo criadas para o Congresso terão um espaço gratuito para visitação da população, em projetores e monitores (com controle de entrada para permitir distanciamento social, distribuição de máscaras e todos os cuidados necessários com a prevenção de contágio) na nossa sede centenária do IAB-RJ (Beco do Pinheiro, 10, Flamengo) de modo que se não podemos convidar os arquitetos do mundo para conhecerem a nossa cidade neste momento, ao menos possamos compartilhar com a nossa população o que têm refletido arquitetos e arquitetas da China, de Angola, de Portugal, da Dinamarca, etc.
Qual será a pauta de discussão?
O tema principal do Congresso, definido muitos anos atrás – Todos os Mundos, um só Mundo, Arquitetura 21 – não poderia ser mais profético, pois a pandemia evidenciou que estamos todos conectados e interdependentes.
Evidenciou também que a urbanização acelerada e as desigualdades sociais requerem soluções emergenciais. Mais do que nunca temos o compromisso de refletir e propor essas soluções que, certamente, representam um novo modelo de cidade.
Esse tema se desdobra em nossas discussões em quatro eixos temáticos: Fragilidades e Desigualdades; Diversidade e Mistura; Mudanças e Emergências; Transitoriedades e Fluxos. Sob esses eixos, discutimos temas como saúde urbana, mobilidade, habitação social e assentamentos urbanos, saneamento e uso das águas, eficiência energética, patrimônio e cultura entre diversos outros.
Quais serão as principais atividades paralelas?
Teremos eventos promovidos em parceria com instituições da Itália, da Dinamarca, da Suíça, da França e da China, além de mais de 40 instituições culturais do Rio de Janeiro que propuseram exposições presenciais até o início da pandemia e virtuais agora que estamos vivendo esse drama coletivo.
São desde conferências e debates, até exposições, workshops, mostras de cinema, lançamentos de livros. A agenda é extensa e cada um desses eventos está sendo divulgado em nossas redes.
As atividades culturais não se encerram em julho, de setembro a novembro teremos um pavilhão da Suíça montado na praça Mauá, refletindo sobre a técnica do barro, tão comum aos nossos povos originários no Brasil e sobre as novas tecnologias que os têm permitido “imprimir” casas em barro na Suíça.
As atividades conjuntas com a China também terão muitos desdobramentos; e exposições que envolvem um número grandes de países, como a “diálogos emergentes” criada pela Confederação de Arquitetos de língua Portuguesa, seguirá gerando muitos frutos até o fim do ano.
No congresso também teremos lançamento de diversos filmes e livros ligados ao tema do congresso e as atividades de abertura e encerramento incluirão projeção mapeada no Cristo Redentor e participações da Orquestra Sinfônica Brasileira, da Aldeia Indígena Pataxó de Paraty e da escola de samba Mirim da Estácio.
Como a sociedade poderá acompanhar o evento?
Para ampliar o alcance do evento e mostrar a toda a sociedade o que estamos debatendo, fizemos, de março a julho, Semanas Gratuitas, com palestras e debates transmitidos abertamente, mesmo a quem ainda não estava inscrito no UIA2021RIO.
As atividades de julho são restritas aos congressistas, mas muitos eventos culturais repercutirão as abordagens do nosso congresso. É o caso, por exemplo, do workshop realizado pelo Galpão Aplauso, que questiona o modelo de cidade baseado na relação centro-periferia, além de diversas dessas atividades complementares que citei, que são abertas e gratuitas. E contamos com o trabalho da imprensa que também é fundamental para levar as nossas discussões à sociedade.
Qual será a contribuição do Congresso para a humanidade?
A grande contribuição que desejamos, com diz o lema do Congresso, é a abertura cada vez maior de um diálogo franco e inclusivo entre todos os mundos, que precisam de fato ser tratados como um só mundo, como essa pandemia tem nos mostrado.
O propósito do 27º Congresso Mundial de Arquitetos é a reflexão sobre a situação em que chegamos e a proposição, através do diálogo e do espaço para o contraditório, de soluções para as cidades do futuro.
O evento culminará com a redação de um documento – a Carta do Rio – que cumprirá justamente o papel de consolidar esse diálogo amplo, que é tão essencial neste momento, e apontar para um longo caminho de correção de injustiças históricas e de consolidação de um mundo mais sustentável, mais justo, mais democrático e melhor para todos e todas.