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  • Rui Moreira Lima: O exército brasileiro era pró-nazi

    Agenda Bafafá em 22 de Maio de 2016    Informar erro
    Rui Moreira Lima: O exército brasileiro era pró-nazi

    Rui Moreira Lima, maranhense integrou o esquadrão de pilotos da Força Aérea Brasileira - FAB conhecido como “Senta a Pua” que lutou contra o nazi-fascismo na Itália entre 8 de outubro de 1944 e 26 de junho de 1945. Herói nacional, participou de 94 missões de combate e seu avião, um P-47, chegou a ser atingido nove vezes. O Brasil foi o único país latino-americano a enviar uma divisão de infantaria e um esquadrão de aviões de caça para combater na Europa. Este último, tinha 49 pilotos e 417 pessoas de apoio. Os feitos foram impressionantes. Ele lançou 4.442 bombas, destruiu 412 estradas, 1.085 veículos motorizados, 105 locomotivas e três refinarias.

    Conhecido por suas posições nacionalistas, Moreira Lima foi cassado e preso três vezes a partir do golpe de 64 - que ele condenou duramente e que tentou enfrentar quando dirigia a Base Aérea de Santa Cruz. Foi promovido a brigadeiro na reserva.

    Hoje em dia, participa de dezenas de debates e mesas-redondas promovidos por entidades da sociedade civil. Nesta entrevista exclusiva ao Bafafá, Moreira Lima revela que o exército brasileiro, no início da Segunda Guerra, era favorável ao Eixo e que Vargas relutou em declarar guerra ao nazismo.

    Fale sobre sua formação militar: Meu pai era desembargador em 1939, na época que eu entrei para a Escola Militar. Ele era civilista e não queria que eu seguisse a carreira militar de jeito nenhum. Nós éramos 12 irmãos, oito homens e quatro mulheres. Depois do segundo ano na Escola Militar, eu fui transferido para a Escola da Aeronáutica, em 1941, onde aprendi a voar.

    Por que o Brasil demorou a declarar a Guerra contra o nazismo? Porque a cúpula do exército brasileiro - Dutra, Góis Monteiro - era pró-nazi, pró-alemã. Dentro do governo do presidente Vargas, Oswaldo Aranha, era a única pessoa pró-americana. Na minha opinião, com toda a ditadura de Vargas e o paradoxo de eu ter ido para Guerra contra a ditadura nazi-fascista, ele tinha um sentido nacionalista. Ainda assim, em 11 de junho de 1941, Vargas fez um discurso absolutamente pró-nazi, apesar do mundo inteiro já ter se definido a favor dos aliados. Foi quando Oswaldo Aranha, que estava em Washington, veio ao Brasil e argumentou com o presidente que a posição do país estava errada, que o nazismo era racista, indo contra a nossa mistura de raças. Vargas considerou os argumentos e autorizou o uso das Bases Militares de Natal para aviões da Força Aérea Americana seguirem para Dacar, no Senegal, abaixo da linha inimiga. Na verdade, quase fomos obrigados a ceder as bases, se não o fizéssemos, eles iriam tomá-las de nós. Getúlio sabiamente acabou negociando a ida de 25 mil soldados para lutar na Itália. Ele queria que o Brasil, quando terminasse a guerra, sentasse no banco de divisão dos reparos de guerra.

    Como foi formado o esquadrão que lutou na Itália?  O ministro da Aeronáutica era o Salgado Filho e em seu gabinete tinha o piloto de Getúlio, o capitão Nero Moura que formou e comandou o esquadrão. Ele sabiamente pediu voluntários para a empreitada. Eu estava em Natal, pilotando um P-40, avião de caça, quando soube que seria criado um grupo de caça para lutar na Europa. Então eu fui ao comandante e pedi para colocar meu nome. Nero escolheu quem ia comandar as esquadrilhas e foi para a Escola de Tática Aérea em Orlando nos EUA. Levou 16 sargentos e 16 oficiais para tomar conhecimento do que era uma unidade tática de combate, que nós não conhecíamos: operações, informações, manutenção, suprimentos, comunicações. Depois, 49 pilotos foram para o Panamá onde foi feito um treinamento de dois meses para lutar. Nós fomos para uma Base de Caça e nos prepararam. Cada um voou 106 horas num P-40 e depois passamos a fazer parte da defesa do Canal do Panamá. Fomos treinados para a guerra, avião com avião. Com isso, fomos muito bem adestrados. E ainda escolhemos o avião que íamos voar. E como isso? Assistimos a palestras de três pilotos, um de P-38, outro de P-47 e outro de P-51 e nos convencemos que o P-47 era o melhor: tinha dois mil cavalos, pesava sete toneladas, tinha oito metralhadoras ponto 50, levava seis foguetes, duas bombas de 500 libras e ainda gasolina gelatinosa. Em combate, você dava uma injeção de metanol, que a gente chamava de injeção d’água, e em 15 segundos ele aumentava a potência em 350 cavalos. Ele dominava qualquer avião da época. Então, o Brasil comprou os P-47 diretamente da fábrica em Nova Iorque. Cada piloto voou 76 horas, repetindo todo o treinamento, escolta, tiro terrestre, tiro aéreo, bombardeio de caça, bombardeio rasante. Seguimos então para a Itália, onde ficamos em Pisa ao norte de Roma. Dos 49 pilotos, tivemos nove mortos, cinco foram capturados e viraram prisioneiros de guerra, três ficaram escondidos no front com guerrilheiros e seis voltaram ao país. Em 22 de abril de 1945, éramos só 22 pilotos. Apesar disso, tínhamos que voar se não íamos voltar para o Brasil. Queriam nos substituir e nós não aceitamos de jeito nenhum e dissemos que íamos voar, até três missões por dia, se necessário. Ao término da guerra, nosso esquadrão foi distinguido por uma medalha da Presidência dos Estados Unidos, pela coragem e técnica no teatro de operações. Nossa força representava 5% do efetivo aéreo no Mediterrâneo, mas destruiu dos inimigos 15% das viaturas motorizadas, incluindo blindados, tanques, jipes, 28% de pontes, 36% de depósitos de combustíveis e pasmem, 85% dos depósitos de munição. Isso estourou e nós ficamos conhecidos. Porque que nós conseguimos estes resultados? Porque éramos voluntários, bem treinados e com um bom avião.

    Como o sr. se define politicamente? Eu nunca fui comunista, ideologia que nunca me afetou. Já o fascismo tupiniquim, liderado pelo integralismo de Plínio Salgado, era paramilitar e autoritário. Então passei a ser anti-fascista até mesmo sem ter consciência disso. Eu não podia ver aqueles caras com insígnias e a ascensão de Hitler que sonhava em fazer um Terceiro Reich de mil anos. Quando estourou a guerra, em 1939, os cadetes tomaram partido, ao vaiarem o embaixador e o adido militar alemão quando eles visitaram a escola. Não eram só os estudantes de Direito que se manifestavam.

    O golpe de 64 poderia ter sido evitado?  Eu era comandante da Base de Santa Cruz onde tinha três unidades operacionais, o Grupo de Aviação Embarcada e dois Esquadrões de Caça. No dia 1º de abril choveu muito então não dava para a gente decolar e atacar a coluna do general Mourão que vinha de Juiz de Fora. Ainda assim, acho que o golpe só poderia ter sido protelado. Quando o presidente Goulart voou para o Rio Grande do Sul e de lá para o Uruguai, uma esquadra americana do Caribe estava na costa de Vitória. Se houvesse uma reação os americanos iam interferir.

    O ciclo de 1964 está encerrado? Com o golpe eu fui preso várias vezes. Hoje, o grande problema é a gente não entregar a Amazônia, a Base de Alcântara, não permitir golpes e deixar Lula governar. Os 21 anos de ditadura foram muito prejudiciais mas paralelamente os militares fizeram a Eletrobrás, a Embratel, a Vale do Rio Doce, a Base Aérea de Alcântara.

    Como viu a eleição de Lula?  É um fenômeno no Brasil. O povo votou na mudança, tava cheio desses governos pós 64. Até os militares votaram no Lula.

    Novembro de 2002 Entrevista concedida a Ricardo Rabelo



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      • Comentário do post Tarcísio Frascino Fonseca:
        Excelente depoimento. Que seja exemplo para muitos.

      • Comentário do post Maria Zélia Oliver:
        Gostei da entrevista. Onde posso encontrar mais sobre o entrevistado Rui Moreira Lima?


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