Agenda Bafafá em 06 de Maio de 2016 - Informar erro
O violonista Yamandu Costa nasceu em Passo Fundo em 24 de janeiro de 1980. Aprendeu a tocar aos sete anos ensinado pelo pai Algacir Costa, a quem acompanhava tocando música regional em bailes e concertos no interior do Rio Grande do Sul. Aos 17 anos descobriu os violonistas Baden Powell e Raphael Rabello que viraram referência musical. Hoje toca estilos diversos como bossa nova, choro, milonga, tango e samba, sendo apontado como a nova estrela do violão brasileiro, em especial do violão de 7 cordas.
Em entrevista ao Bafafá, Yamandu Costa fala do seu primórdio de carreira, suas influências, estilos, conceitos e projetos. “Essa tendência de mistura já fazia parte da minha formação. Meu estilo musical é a Música Popular Latino-Americana”, garante o artista. Sobre política, elogia o governo Dilma. “Muita coisa está acontecendo, o Brasil está numa onda boa. Só fico triste quando volto de viagem e vejo a diferença social aqui. Torço para que melhore e cada um faça a sua parte para isso”.
Como foram a sua infância e juventude?
Completamente ligadas à música. Minha família vivia dela, tanto meu pai como minha mãe. Os dois tinham um grupo chamado “Os Fronteiriços” do qual cantava desde os quatro anos de idade. A música sempre foi uma coisa muito natural e não uma opção no bom sentido (riso). Quando dava procurava ter uma infância “normal”, apesar de estar quase sempre viajando para tocar em bailes e concertos (riso). Eu adorava, andava sempre no meio de adultos. Comecei a tocar violão só a partir dos sete anos.
Aprendeu em casa?
Meu pai era um ótimo violonista e aprendi os primeiros passos com ele. No entanto, desde pequeno desenvolvi uma maneira de tocar completamente minha, ele me dava liberdade de ouvir coisas diferentes. Eu gostava de tocar de palheta, uma prática que não é muito típica de um violonista que toca com a mão, as unhas.
E a opção pelo violão de sete cordas?
Veio bem depois, aos 17 anos. Isso aconteceu quando voltei dos Estados Unidos onde cheguei a gravar um CD com um violão de seis cordas. Fui tocar num festival em São Paulo chamado “Chorando Alto” com os maiores músicos do Brasil. Na ocasião, conheci o violonista Mário Eugênio que me apresentou o violão de sete cordas. Nunca mais larguei e acabei comprando o violão dele (riso). A partir daí ele se tornou meu instrumento. Por ter uma corda a mais, ele abre muitas possibilidades, outro universo. A história deste instrumento é interessantíssima. Sua origem é russa e chegou aqui no início do século passado através dos ciganos. Hoje está completamente incorporado na música brasileira.
Você tocou música regional até quando?
Toco até hoje (riso). Na verdade eu descobri a cultura regional de outros estados (riso). O choro e o samba não são mais do que isso, são estilos daqui. Até os 13 anos só tocava música regional gaúcha. Foi quando conheci a música do sudeste que nos caracteriza mais como música brasileira no mundo. Descobri novos gêneros e me apaixonei por violonistas como Baden Powell e Raphael Rabello. Tive inclusive a honra de tocar com o Baden aos 15 anos. Aos dezoito anos fui morar em São Paulo e acabei vindo para o Rio atrás dessa informação. Aqui é um porto. Não é a toa que essa mistura da música africana com a erudição européia fez essa cultura única no mundo.
Qual é a diferença com São Paulo?
São Paulo é uma cidade que tem outra atitude, outro compromisso com a vida profissional. O carioca tem a cultura do lazer, de curtir a vida de uma forma mais relaxada. O paulista é do mundo, é aquela figura que tem ambição, que quer vencer. São Paulo inclusive tem mais mercado. O Rio de Janeiro é mal acostumado, a oferta é grande, a cidade é charmosa (riso). Morar no Rio é um privilégio, é como fazer parte de uma “bollywood”, de um estilo de vida. Ainda assim é muito complicado trabalhar no Rio, não se dá muito valor às coisas, tem muita despreocupação, é algo que incomoda um pouco. Pelo outro lado, a cidade é tão querida e acolhedora. Nem penso em sair daqui onde estou desde 2001 (riso).
Sua mistura musical começou no Rio de Janeiro?
Mais ou menos. Essa tendência de mistura já fazia parte da minha formação. Meu pai já fazia uma música de fronteira, com influência latino-americana. Isso é muito natural para mim. Só não toco música clássica, não é meu estilo.
O que acha de ser comparado a Baden Powell?
As pessoas precisam de referência, por isso existe a tal da comparação. Eu venho de outra “moldura” e tenho outra informação. Acho uma honra ser comparado a esses grandes mestres, mas não tenho essa pretensão. A minha intenção é fazer a América Latina se conhecer mais. O Brasil é um país muito isolado. Se eu conseguir aproximar essas culturas, tocando e gravando, será uma grande contribuição que poderei dar à música.
Como é ser violonista no Brasil?
Um privilégio. O Brasil é um país que fez do violão um instrumento de enorme gama, fazer parte disso é fantástico, tendo inclusive suporte de figuras como Baden Powell e Raphael Rabello. E viver disso também (riso). Acabei de chegar de Zimbabwe na África, estou viajando para Cuba e em junho vou para Tampere, na Finlândia e Tallinn, na Estônia. A música é meu lazer e meu ofício.
Onde mais gostou de tocar?
A platéia japonesa é espetacular, é um povo mais atencioso nos shows, se emociona mais. Ela tem uma cultura muito atravancada, uma personalidade mais para dentro, mais complicada. Quando destrava, é um rio de lagrimas, de felicidade. Os japoneses adoram a música brasileira. A música proporciona falar com qualquer cidadão do mundo dentro dessa linguagem da emoção e do sentimento.
O Brasil valoriza a música instrumental?
O problema é que o Brasil vê essa música como música instrumental. Essa definição só é usada na América Latina, essa separação atrapalha o nosso serviço. Você chamaria a música clássica de instrumental mesmo ela não tendo letra? A mídia tem “pena” da música instrumental e presta um desserviço. Em qualquer lugar eu falo que sou violonista, aqui sou músico instrumental. Esse clichê atrapalha. Meu estilo musical é a Música Popular Latino-Americana.
O que acha da MPB?
É uma sigla, nada mais disso. É uma maneira de classificar, generalizar. Nosso país é tão grande e diferente que é impossível classificar a nossa música.
E do funk?
É um ritmo que se abrasileirou. Virou o canto de um povo que não teve oportunidade de ouvir outras coisas. É uma música que tem muita ligação com a rima que sempre existiu, inclusive no Brasil com o trovador, o repentista. Não é uma música que eu escuto, mas tenho o maior respeito.
Concorda que a década de 90 é perdida musicalmente?
Não, acho que sempre acontece muita coisa mesmo nas entrelinhas. Algumas coisas são murchas propositalmente para que outras estourem (riso). Acho que temos espaço para outros estilos, somos um povo novo que está se criando.
Quais são seus projetos no momento?
Esse ano está cheiíssimo. Muitas viagens, gravando minhas músicas e preparando seis discos para sair. Meu projeto é ter saúde para tocar e compor.
Como você está vendo o governo Dilma?
Estou gostando, sou do PT e tenho a idade dele. Vi o que o partido fez em Porto Alegre. Eu gosto muito da Dilma, é séria. A gente vem tendo sorte com nossos governantes. Muita coisa está acontecendo, o Brasil está numa onda boa. Só fico triste quando volto de viagem e vejo a diferença social aqui. Torço para que melhore e cada um faça a sua parte para isso.
Quem é Yamandu Costa?
Sou uma pessoa apaixonada pelo que faço, agradeço o carinho e o fato das pessoas confiarem em mim (riso). Sou devoto ao meu público, sem ele sou totalmente perdido. É um privilégio fazer música. Sou um cara que está sempre se conhecendo e aprendendo que todo dia é importante. Sou apaixonado pela vida!
Tem alguma utopia?
A minha utopia é de construir as coisas. Quero seguir para frente e olhar para trás sem arrependimento.
Maio 2012