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  • Zeca Pagodinho: Queria ver um Brasil melhor

    Agenda Bafafá em 15 de Fevereiro de 2021    Informar erro
    Zeca Pagodinho: Queria ver um Brasil melhor

    Nascido em Irajá, subúrbio do Rio, em 1959, Jessé Gomes da Silva Filho, o Zeca Pagodinho, trabalhou duro antes de conhecer a fama. Quarto de uma família de quatro filhos, foi feirante, camelô, office-boy, contínuo e até anotador de jogo do bicho.
     
    Apesar disso, o samba estava marcado em seu caminho. Zeca não perdia uma roda no bairro e criava amizade com bambas como Monarco, Almir Guineto, Mauro Diniz e Paulão 7 Cordas. A partir de antológicas rodas de samba no Cacique de Ramos, que frequentava assiduamente, teve músicas gravadas por Beth Carvalho e Alcione. O sucesso veio a galope. Zeca Pagodinho é hoje unanimidade nacional e, sem dúvida, o sambista mais bem sucedido do Brasil.

    O artista está lançando o projeto multimídia “Sambabook Zeca Pagodinho” que inclui dois CDs, DVD, Blue Ray, especial de TV, discobiografia, partituras e até aplicativo para smartphones e tablets.

    Em entrevista ao Bafafá, Pagodinho fala sobre espiritualidade, música, inspiração e temas sociais. “Me incomoda muito ver crianças nas ruas cheirando cola”, critica o artista. Questionado se tem alguma utopia, não vacila em responder: “Queria ver um Brasil melhor”.

    Você é uma pessoa espiritualista?
    Eu sou. Amo a Deus em primeiro lugar. Sem ele ninguém anda para frente. Minha cabeça quer cantar e viver. Meu papel é fazer e cantar samba, levar alegria, buscar alegria.

    A espiritualidade ajuda na tua carreira?
    Sempre, com São Jorge, as crianças aqui no meu peito (Cosme e Damião). É bom estar com Deus no coração, os orixás, os mentores do bem.

    Você frequenta rodas de samba?
    Não dá mais. Estou sempre chegando de viagem e com agenda cheia. Eu geralmente sou convidado por amigos para rodas em Xerém e Curicica, mas sempre informalmente. A roda do Cacique de Ramos agora é tocada por outra geração de músicos, é uma turma legal, mas não é a minha praia. E também não dá mais para ficar até 5 horas da manhã na rua (riso).

    O sucesso atrapalha?
    Atrapalha em alguns momentos, a moeda tem dois lados. Sou um ser humano, tem dia que acordo invocado. Eu gostaria de ir ao zoológico com a minha filha e não posso. Tenho que explicar isso para ela. Em Xerém vou ao supermercado, à feira, todo mundo me conhece. Até os caras dos CDs piratas quando me veem falam “olha ele ai” (riso). O meu trabalho sustenta e leva alegria para muita gente. Teve um médico que disse que seu paciente só se acalmava ouvindo “Deixa a vida me levar”.

    Qual é o melhor lugar para compor?
    Isso não existe. Até em sonho eu componho. Acordo no meio da noite e ligo o gravadorzinho para não esquecer. Quando quero compor chamo o Arlindo Cruz, Dudu Nobre e Jorge Aragão. Nestes encontros, a gente faz 10 músicas e em compensação fica três dias de ressaca (risos).

    O amor é a melhor fonte de inspiração?
    Quando você está amando está em estado de graça. Não tem como ser repetitivo, basta ver o Arlindo escrever um samba atrás do outro.

    Como você está vendo a violência no Rio de Janeiro?
    Até os violentos estão incomodados. Só Deus mesmo para resolver. Se a gente não tiver fé, não resolve. Não pode é vacilar na fé.

    Como define esse novo trabalho sambabook?
    Ainda bem que estou vivo e não morri né? (riso). Estou meio pálido nesta foto (riso). A gravação foi uma festa, como são todas as minhas gravações. A Brahma pôs uma geladeira cheia de cerveja e a Velha Guarda levou galinha com quiabo (riso). Recebi o Frejat, Dudu Nobre, Maria Rita e um monte de convidados. A lista foi feita pela gravadora, não opinei.

    Quando soube do sambabook?
    Tomei conhecimento do projeto quando estava ensaiando e o Martinho estava gravando do outro lado. Aí vi maior festa rolando quando ele gravava o sambabook dele com um monte de convidados.

    E se o Frejat te convidar a gravar rock?
    Eu vou lá e canto (riso).

    Como está vendo as novas mídias?
    Eu não sei mexer com tecnologia, não sei fazer nada (riso). Até para ouvir CD preciso de alguém para ligar o som. Botaram um aparelho tão moderno que eu não sei ligar. Só escuto música quando vou a Xerém e ouço os cedezinhos dos meus compadres já pensando nos que posso gravar.

    As escolas de samba estão voltando a olhar para o samba de raiz?
    Eu não sou cria de escola de samba. Eu venho de terreiros e de blocos. Antigamente a gente falava que nosso pessoal era de “meio de ano”. Era o samba de inverno, de botequim. Era um samba que começava com choro e depois virava partido alto. Quando chegava novembro a gente parava com as rodas. Mas, sou portelense e apaixonado pela sua velha guarda que está sempre cantando na minha casa.

    Verdade que vai lançar uma música para a Copa do Mundo?
    Sim, um samba do Altair Veloso e Paulo César Feital que eu acabei de gravar para o disco Festa Brasil com músicas para a Copa.

    Você é bom de bola?
    Nunca fiz um gol. Mas, na vida é diferente, fiz vários (riso).

    Se o Brasil for à final, quem seria melhor enfrentar?
    Pô, que perguntão para quem não entende nada de futebol! Não sei, talvez o meu time de Xerém (riso). Agora, Brasil é Brasil, né? Vou enfeitar a minha casa. Eu gosto é da festa. Não vou ao Maracanã, vai ser lá em casa mesmo com minha cervejinha ao lado do telão.

    Você acha que sua carreira ajudou a levantar o samba?
    Foi a Beth Carvalho que abriu tudo aí. Ela já tinha nome e levou a rapaziada do Cacique para tocar e gravar com ela.

    Por que as rádios tocam pouco samba?
    Essa pergunta merecia um respostaço, mas eu não tenho para te dar. Eu tenho vontade de abrir uma rádio para tocar só o que eu gosto (riso). O que eu sei é que a cada dia está pior para ouvir rádio. O que salva é o programa da Dorina e do Rubens Confete na rádio Nacional.

    Em seus 30 anos de carreira qual é a música que mais ter marcou?
    Acho que foi “Deixa a vida me levar”. O Brasil inteiro cantou e se emocionou com esta música.

    Quem é Zeca Pagodinho?
    Esse cara que você está vendo. Posso estar aqui, ou na favela, na praia, em Xerém ou no palco. Eu sou uma mistura de Almir Guineto, Martinho da Vila, João Nogueira, Paulinho da Viola. Eu venho dessa escola aí.

    Qual seria seu recado para as novas gerações de músicos?
    Não desistir, né? Mas, tem que fazer música boa, com mensagem e qualidade. 

    Você tem alguma utopia?
    Queria ver um Brasil melhor e que as guerras acabassem. E que as crianças tivessem escolas. Me incomoda muito ver crianças nas ruas cheirando cola.

    Maio de 2014



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