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  • Sem mídia democratizada, não há futuro, por Ângela Carrato

    Da Redação em 04 de Setembro de 2022    Informar erro
    Sem mídia democratizada, não há futuro, por Ângela Carrato

    Dos muitos assuntos interditados pela mídia privada brasileira, o principal e mais antigo deles se refere à própria mídia. O Brasil, dos principais países ocidentais, é o único em que a mídia audiovisual (rádio e TV) age desregulada. 

    O Código de Telecomunicações em vigor é de 1962. Nasceu desfigurado, fruto da pressão dos “barões” da mídia e não foi alterado até agora.

    Nas entrevistas e debates com os candidatos à presidência da Republica nas eleições deste ano, você também não ouvirá nenhuma pergunta sobre o assunto. Sabe por quê?

    Para a mídia privada, praticamente a única que temos, a melhor forma para continuar dando as cartas é garantir que tudo fique como está.

    A Constituição brasileira de 1988, denominada “cidadã”, no título VIII, capítulo V Da Comunicação Social (artigos 220 a 224), elenca os aspectos essências do que são os elementos para uma mídia democratizada:
     
    1. Proíbe monopólios e oligopólios.
    2. Prioriza as finalidades educativas, artísticas e culturais na produção e programação das emissoras de rádio e televisão.
    3. Garante estímulo à cultura nacional e regional.
    4. Prevê a existência e a complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal.

    Para entrarem em vigor, esses artigos necessitam de legislação ordinária. Vale dizer: precisam ser aprovados pelo Congresso Nacional.

    A BBC do Reino Unido é uma emissora pública de rádio e televisão, considerada a melhor do mundo. Os Estados Unidos também têm sua rede pública de rádio e TV. É ela que promove os principais debates entre os candidatos à Casa Branca.

    Na nossa história republicana recente, nenhum governo, mesmo os progressistas, enviou ao Congresso Nacional projeto regulamentando tais artigos. A razão é simples: os “barões” da mídia privada brasileira têm tido papel de absoluta preponderância na derrubada de presidentes progressistas, devido ao fortíssimo lobby que exercem junto  ao Poder Legislativo.

    Basta lembrar que estes “barões” estão diretamente envolvidos na deposição de Getúlio Vargas em 1945, no suicídio do próprio Vargas, em 1954, no golpe contra João Goulart em 1964, nas campanhas contra Lula, em seus dois governos, e no golpe, travestido de impeachment, contra Dilma Rousseff, em 2016.

    Talvez a principal razão do ódio contra Lula é que ele tentou estabelecer uma legislação para o setor ao propor a existência do Conselho Federal de Jornalismo e de uma agência reguladora para o audiovisual.
     
    Nos dois casos, foi derrotado, mas foi bem sucedido ao criar a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), com suas emissoras pública (TV Brasil) e estatal (TV NBR). Emissoras que Temer começou e Bolsonaro está terminado de destruir.

    De uma vez por todas, vamos entender. Mídia regulada não é mídia censurada. Mídia regulada é mídia democratizada, pluralizada, em termos de propriedade e das vozes/temas que veicula.

    É assim que a mídia funciona nos países europeus, no Japão, na Austrália, nos Estados Unidos, no Canadá, na Argentina e em grande parte da América Latina.

    O Brasil está atrasado décadas neste setor, especialmente quando se sabe que agora o mundo se preocupa é com a regulação das big techs e de suas plataformas  (Facebook, Google, Twitter, Whatsapp).

    De pouco adiantará elegermos governos progressistas, se não formos capazes também de elegermos deputados e senadores comprometidos com a democratização da mídia. Se não formos capazes, enquanto sociedade civil, de possibilitar ao novo governo o apoio necessário para mudar esta situação.  

    Precisamos de uma mídia democratizada para chegarmos ao XXI. Sem ela, seguiremos sendo o país de um futuro que nunca chega e de um presente cada vez mais semelhante ao passado.
     
    Ângela Carrato, jornalista, mestre e doutora em Comunicação pela UnB, professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG.
     


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