Nascido em 1898, Heitor dos Prazeres era um artista negro a frente de seu tempo que marcou época no Rio de Janeiro na primeira metade do século XX. Filho do marceneiro e clarinetista da banda da Guarda Nacional, seu destino como artista estava marcado nas estrelas. Aprendeu com o pai a tocar clarinete em vários ritmos como polcas, valsas, choros e marchas.
Para chegar ao estrelato, Lino, como era chamado pela família, passou por grandes dificuldades. Perdeu o pai aos 7 anos e chegou a trabalhar como engraxate e vendedor de jornais. Ainda menino, Heitor gostava de apreciar os músicos que se apresentavam na cidade e aos 12 anos ganhou do tio um cavaquinho que o acompanharia a vida toda. Como tinha muito jeito com o instrumento passa a ser chamado de Heitor do Cavaquinho.
Aos 13 anos, Heitor foi preso por vadiagem e fica dois meses na colônia correcional Dois Rios, na Ilha Grande.
Por sorte da música compõe seu primeiro samba em 1912 e assistido por outros sambistas e compositores como João da Baiana, Caninha, Ismael Silva, Alcebíades Barcelos (Bide) e Marçal ajuda a organizar vários grupos de samba do Rio Comprido, Estácio, na Mangueira e Oswaldo Cruz com Cartola, Paulo da Portela, João da Gente, Manoel Bambambam e outros.
Heitor foi artífice do movimento que levou à criação das primeiras escolas de samba: Deixa Falar, De Mim Ninguém se Lembra e Vizinha Faladeira no Estácio; Prazer da Moreninha e Vai como Pode em Madureira.
As duas últimas se uniram e se tornaram a Portela, sua escola de samba favorita, cujas cores azul e branco foram escolhidas por ele. A Portela, em 1929 foi a primeira vencedora de uma competição entre escolas, com a sua composição Não Adianta Chorar.
Ele participou ainda da formação da Estação Primeira de Mangueira com Cartola e, em 1928, a União do Estácio, com Nilton Bastos, "Bide" e Mano Rubem.
Mas, como todo gênio, ele não ficaria restrito à música. Na década de 1930, dedica-se às artes visuais, especialmente à pintura, por incentivo do desenhista, jornalista e crítico de arte Carlos Cavalcante, do pintor Augusto Rodrigues e do escritor Carlos Drummond de Andrade. E obtém grande reconhecimento sendo até hoje reconhecido como artista estilo "naif", inclusive com exposição ocupando oito salas do CCBB Rio.
Duas de suas composições que o popularizaram foram Deixaste meu lar e Estas farto de minha vida, ambas de 1925 e gravadas por Francisco Alves. Outro tema de sua autoria da mesma época era Deixe a malandragem se és capaz.
Em 1933, ele compôs Canção do jornaleiro . A partir da letra autobiográfica autobiográfica deste tema, que lida com a vida das crianças que vendem jornais nas ruas, se iniciou uma campanha para financiar a construção da Casa do Pequeno Jornaleiro, que abriu em 1940.
Sua residência na Praça Tiradentes era um ponto de encontro de pessoas interessadas em seu conhecimento da cultura afro-brasileira e de seus mais importantes centros de encontro. Entre os visitantes, estava o estudante de medicina e futuro compositor Noel Rosa que lhe pediu ajuda para enfrentar um marinheiro agressivo que estava assediando sua namorada.
Dos Prazeres era conhecido naquele bairro como um especialista em capoeira e um aviso ao marinheiro era o suficiente para afastá-lo. Ao retornar, enquanto cantarolava a marcha que estava compondo e para a qual também estava conduzindo uma ilustração, Noel Rosa sugeriu algumas mudanças na letra.
Assim, ele tornou-se co-autor de Pierrô Apaixonado (lançado em 1936), um dos maiores sucessos de Heitor dos Prazeres. Naquela noite Drummond, outro de seus visitantes freqüentes, levou-lhe um poema de sua autoria para ser musicado, O Homem e seu Carnaval (1934). Ainda que não tenha conseguido musicalizá-lo, mais tarde foi inspirado por esse poema para criar um quadro de mesmo nome.
Em 1937, começou a exibir suas pinturas, nas quais retratou a vida nas favelas: crianças brincando, homens jogando ou bebendo, jovens dançando samba, etc. Representava os rostos das pessoas de perfil, com a cabeça e os olhos voltados para cima.
Nessa época ele se casou com Nativa Paiva, com quem teve dois filhos: I drolete e o músico Heitorzinho dos Prazeres. Seu primeiro filho inspirou o tema A Coisa melhorou, cuja letra inclui o famoso verso: É mais um guerreiro, é mais um carioca, é mais um brasileiro.
Esta edição marcou o início da carreira solo da cantora Carmen Costa e foi gravado em uma das primeiras gravadoras independentes do Brasil.
Em 1939 e 1941 participou em São Paulo do evento Carnaval do Povo com o grupo Embaixada do Samba Carioca, criado para a ocasião. Participaram mais de cem artistas como Paulo da Portela, Cartola, Carmem Costa, Dalva de Oliveira, Aracy de Almeida, Francisco Alves, Carlos Galhardo, Bide, Marçal, Henricão, Herivelto Martins e Nilo Chagas (duo Branco e Preto, depois Trio de Ouro com Dalva de Oliveira).
Este evento ao ar livre, organizado pelo radialista e compositor Adoniran Barbosa e transmitido pelas rádios Cruzeiro do Sul e Kosmo, conquistou o samba em terras paulistas e de lá para Buenos Aires e Montevidéu.
Graças à repercussão desse tipo evento o samba tornou-se aceito pelos setores mais ricos e ser ouvido maciçamente em casinos, cinemas, rádios, etc.
No final de 1930 atuou como músico, cantor e dançarino no Casino da Urca com Josephine Baker e Grande Otelo. Foi contratado por Orson Welles como coreógrafo de um filme sobre cultura afro-brasileira, centrado no samba e no carnaval. Também tocou seu cavaquinho em programas de auditório das rádios do Rio de Janeiro acompanhado pelo grupo Heitor dos Prazeres e Sua Gente, composto por vocalistas e outros músicos percussionistas e passistas.
Em 1943 obteve o primeiro concurso oficial de Música de Carnaval , organizado pela prefeitura do Distrito Federal, pelo samba Mulher de malandro, na voz de Francisco Alves.
Também nesse ano apresentou o samba Lá em Mangueira, co-escrito com Herivelto Martins e gravado pelo duo Branco e Preto e Dalva de Oliveira, começou a trabalhar na Rádio Nacional do Rio de Janeiro e a expor suas pinturas em exposições locais e no exterior. Graças a uma exposição organizada pela RAF em Londres para arrecadar fundos para as vítimas da Segunda Guerra Mundial, a então princesa Elizabeth adquiriu seu quadro Festa de São João.
A pedido de seu amigo Carlos Cavalcante, em 1951 participou da primeira Bienal de Arte Moderna de São Paulo, com a presença de artistas de todo o mundo, que ganhou o terceiro prêmio nos artistas nacionais com seu quadro Moenda.
Na segunda Bienal de São Paulo, em 1953, foi reservada uma sala para a exposição de sua obra. Ele criou cenários e figurinos para o balé do quarto centenário da cidade de São Paulo. Em 1959, exibiu pela primeira vez individualmente na Galeria Gea Rio de Janeiro.
Antonio Carlos da Fontoura dirigiu em 1965 um documentário sobre sua vida e obra.
Heitor dos Prazeres morreu em 4 de outubro de 1966 no Rio de Janeiro, aos 68 anos de idade deixando mais de 300 composições.
Em 1999, no centenário de seu nascimento, foi realizada uma retrospectiva de sua obra pictórica no Espaço BNDES e no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Em 2003 a jornalista Alba Lírio publicou o livro Heitor dos Prazeres: Sua Arte e Seu Tempo. E atualmente está com uma grande exposição em cartaz no CCBB Rio.
Fonte: Biblioteca Nacional e Wikipedia