Inaugurado em 5 de setembro de 1963, o Zicartola foi muito mais do que um restaurante no Rio de Janeiro: tornou-se um marco cultural da cidade.
Criado pelo mestre do samba Cartola (Angenor de Oliveira) e sua esposa Dona Zica (Euzébia Silva do Nascimento), o espaço rapidamente virou ponto de encontro de grandes nomes da música brasileira.
Por lá circulavam sambistas como Elton Medeiros, Nelson Cavaquinho, Zé Ketti, Ismael Silva, Aracy de Almeida, além de expoentes da bossa nova como Carlos Lyra e Nara Leão. Foi ali, inclusive, que o jovem Paulinho da Viola deu seus primeiros passos artísticos.
Dona Zica, dona de um talento gastronômico reconhecido, comandou cozinha do restaurante localizado no segundo andar de um sobrado da Rua da Carioca, 53, onde o casal morava no terceiro andar.
Nos primeiros meses, a casa servia apenas refeições caseiras. Mas, ao cair da tarde, sambistas encerravam o dia com rodas de batucada improvisadas. Logo, com o crescimento das escolas de samba e a perda de espaço dos antigos compositores, o Zicartola virou um verdadeiro refúgio. Entre os mais assíduos, estava Zé Ketti, que não apenas divulgava a casa em rádios e jornais, como também idealizou as memoráveis noitadas de samba às quartas e sextas-feiras.
Foi ali que Zé Ketti e Hermínio Bello de Carvalho criaram a divertida Ordem do Cartola Dourada, que homenageava grandes nomes da música brasileira com quadros expostos nas paredes. Tom Jobim, Dorival Caymmi, Elizeth Cardoso e Ciro Monteiro figuravam entre os escolhidos. Não à toa, a inauguração oficial do espaço foi celebrada em clima de consagração.
O Zicartola, acrônimo de Zica e Cartola, também teve papel histórico ao revelar talentos. Um deles foi Paulo César Batista de Faria, então bancário, levado por Hermínio ao restaurante para tocar em um conjunto de acompanhamento.
O jovem chamaria a atenção do jornalista Sérgio Cabral, frequentador da casa, que o batizou de Paulinho da Viola — afinal, “Paulo César não era nome de sambista”.
Com a chegada do regime militar, em 1964, o sobrado ganhou ainda mais relevância: tornou-se espaço de resistência, reunindo intelectuais, músicos e escritores em debates, lançamentos de livros e discursos contrários ao governo. Ao mesmo tempo, havia uma defesa apaixonada da música brasileira, vista como ameaçada pelo avanço das canções estrangeiras, sobretudo as americanas.
Apesar de seu enorme impacto cultural, o Zicartola teve vida curta. Apenas 20 meses após a inauguração, em maio de 1965, fechou as portas por dificuldades administrativas. Os sócios se retiraram, deixando a casa nas mãos de Dona Zica, que, sem experiência em gestão, repassou o sobrado a Jackson do Pandeiro. Ele tentou recriar o modelo, com foco em forró e culinária nordestina, mas também não teve êxito. O espaço foi fechado em pouco tempo.
Fonte: Wikipedia e Biblioteca Nacional