O chocolate amargo pode trazer benefícios à saúde, inclusive para pacientes com doença renal crônica (DRC) em hemodiálise (HD). É o que revela uma pesquisa da Universidade Federal Fluminense (UFF), que identificou efeitos anti-inflamatórios em pacientes que consumiram chocolate com 70% de cacau.
Segundo o Ministério da Saúde e dados da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), 2,4 milhões de pessoas morrem anualmente em decorrência da DRC.
Chocolate como aliado no tratamento
“Pacientes com doenças nos rins enfrentam muitas restrições alimentares, como no caso do chocolate. Embora mais análises ainda sejam necessárias, descobrimos que o chocolate amargo pode ser um aliado saboroso no tratamento”, explica Denise Mafra, professora da Faculdade de Nutrição da UFF e uma das autoras do estudo "Chocolate amargo modula marcadores inflamatórios em pacientes com doença renal crônica em hemodiálise: um ensaio clínico".
A pesquisa indica que o chocolate com 70% de cacau foi capaz de reduzir a molécula inflamatória TNF-α, mesmo que outros marcadores como MDA e LDL oxidada, associados ao estresse oxidativo, não tenham apresentado alterações significativas.
Os elementos da pesquisa
Realizado em 2020 pelo grupo de pesquisa em Nutrição Renal da UFF, o estudo deu origem a trabalhos acadêmicos, como a tese de doutorado de Suzane Fanton e o mestrado de Márcia Ribeiro. A equipe integra o projeto internacional "Food as Medicine" (Comida como remédio), que propõe o uso de alimentos como estratégia terapêutica não farmacológica, sem recorrer à medicalização.
“Utilizamos os alimentos como fontes de compostos bioativos com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias, buscando melhorar a saúde e a qualidade de vida dos pacientes”, afirma Ludmila Cardozo, professora do Departamento de Nutrição Dietética da UFF e vice-coordenadora do grupo. “Já testamos compostos de frutas, legumes e oleaginosas. Desta vez, escolhemos o chocolate, popular mas frequentemente restrito a pacientes renais.”
Doença renal crônica: desafios e cuidados
As DRCs afetam os rins por múltiplas causas e, geralmente, têm evolução assintomática. Nos estágios mais avançados, o tratamento é feito por hemodiálise, que filtra o excesso de resíduos do sangue.
“É uma condição progressiva e irreversível. O tratamento depende do estágio da doença e inclui controle rigoroso da alimentação”, reforça Mafra. Ela destaca a importância do acompanhamento nutricional especializado: “Já há pesquisas mostrando que brócolis e castanha-do-pará são opções adequadas. Cada caso é único”.
Pacientes em hemodiálise têm alto risco de doenças cardiovasculares, agravadas por inflamação crônica de baixo grau e estresse oxidativo. A inflamação é revelada por citocinas como a TNF-α, cuja produção exacerbada leva ao aumento do risco cardiovascular e à mortalidade precoce.
Já o estresse oxidativo ocorre quando há desequilíbrio entre radicais livres e antioxidantes, causando danos celulares. Existem antioxidantes endógenos (produzidos pelo corpo) e exógenos (vindos da alimentação). Entre os alimentos ricos em polifenóis, compostos antioxidantes, estão morango, uva, brócolis, cebola, alho e o chocolate amargo.
Quanto maior o teor de cacau, maior o nível de polifenóis. Por isso, o estudo foca no chocolate com 70% ou mais de cacau — não em versões ao leite ou branco, que não oferecem os mesmos benefícios.
Resultados do estudo
O destaque do ensaio clínico foi a redução da TNF-α em pacientes que consumiram o chocolate amargo. Essa citocina, normalmente produzida em resposta a processos infecciosos, está presente em níveis de 6 a 12 vezes maiores em pacientes renais crônicos do que em pessoas saudáveis.
O chocolate, porém, é geralmente restrito a essa população por conter fósforo e potássio, minerais que precisam de controle rigoroso. No estudo, esses níveis não se alteraram, o que é um dado positivo.
Outros marcadores analisados foram:
MDA (malondialdeído) – relacionado à peroxidação lipídica.
LDL oxidada (colesterol oxidado) – associada ao risco cardiovascular e à formação de placas de gordura nas artérias.
Metodologia do estudo
A pesquisa envolveu 59 pacientes em Blumenau (SC), divididos entre grupo controle e grupo intervenção. Este último consumiu 40g de chocolate amargo três vezes por semana durante as sessões de hemodiálise, ao longo de dois meses.
Foram avaliadas amostras de sangue, verificando marcadores inflamatórios e de estresse oxidativo, além de fósforo e potássio. Houve redução da TNF-α, mas nenhuma alteração nos níveis de MDA e LDL oxidada.
“Essa redução não é perceptível ao paciente, mas é um marcador importante de mortalidade cardiovascular”, explica Mafra. Ainda assim, ela ressalta: “Cada paciente deve ser avaliado individualmente. A pesquisa traz bons indícios, mas não é conclusiva. Precisamos de mais estudos”.
Ambulatório de Nutrição Renal da UFF
A Faculdade de Nutrição da UFF também mantém o Ambulatório de Nutrição Renal, que atende gratuitamente pacientes com DRC, oferecendo consultas, dietas e acompanhamento laboratorial, com o objetivo de retardar a progressão da doença e controlar comorbidades como diabetes e hipertensão.
Segundo Mafra, “Quando o diagnóstico é precoce, conseguimos segurar o paciente fora da diálise por mais tempo. Para isso, criamos uma dieta hipoprotéica, hipossódica, com controle de fósforo e potássio, garantindo a quantidade calórica adequada.”
Agendamento de consultas:
WhatsApp: (21) 98370-7933
Necessário informar nome, idade, telefone, exame recente de sangue e encaminhamento do nefrologista com diagnóstico e estágio da DRC.
Pesquisadoras envolvidas
Ludmila Cardozo: Doutora em Ciências Médicas pela UFF, pós-doutora em Ciências Cardiovasculares, mestre em Saúde da Criança e do Adolescente. Professora da UFF e vice-coordenadora do Grupo de Pesquisas em Nutrição Renal.
Denise Mafra: Doutora e mestre em Ciências dos Alimentos pela USP, graduada em Nutrição pela UFSC. Professora da UFF e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Nutrição Renal. Atua em programas de pós-graduação na UFF e UFRJ, e integra o Comitê de Nutrição da Sociedade Brasileira de Nefrologia.
Fonte: UFF