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  • Costantin Costa Gavras: Gosto muito do Brasil

    Agenda Bafafá em 15 de Agosto de 2018    Informar erro
    Costantin Costa Gavras: Gosto muito do Brasil

    Um dos cineastas mais importantes da atualidade no mundo é o grego naturalizado francês Costantin Costa Gavras. Nascido no dia 13 de fevereiro de 1933 em Arcádia, Grécia, completou os estudos em Atenas mas foi para a França estudar Letras na Sorbonne. Em 1956, se inscreve no Instituto de Altos Estudos Cinematográficos para depois iniciar a carreira de assistente de diretores como René Clair, Yves Allegret, René Clement, Marcel Ophuls, Jean Becker.
     

    Desde o início adota uma linha cinematográfica militante que iria marcar toda a sua vida. Sua filmografia inclui Z (vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1969 - concorreu também à estatueta de melhor filme, do Globo de Ouro na mesma categoria e do Grande Prêmio do Júri em Cannes), Missing, o desaparecido, O quarto poder e Amém, este último que vem causando grande polêmica na Europa desde que foi apresentado no Festival de Berlim deste ano. O filme é inspirado na peça O Vigário do dramaturgo austríaco Rolf Hochhuth, que evoca o silêncio do Vaticano e do Papa Pio XII durante a exterminação de judeus, programada por Hitler na Segunda Guerra.

    Em entrevista exclusiva ao Bafafá, Costa Gavras – que participou do Festival do Rio 2002 - fala sobre Amém e revela estar torcendo pela eleição de Lula para a presidência.

     

    O filme Amém causou bastante repulsa na igreja católica. Principalmente o cartaz considerado inaceitável e uma afronta, já que nele aparece um oficial nazista e um padre numa suástica sobreposta em forma também de cruz. Como o sr. viu a resistência a Amém?

    Não é a igreja católica. São alguns católicos. O escândalo em torno do cartaz é porque a extrema direita francesa, na véspera da eleição, queria aparecer na televisão. Infelizmente alguns bispos franceses seguiram o movimento, mas foi muito local. O que conta é o filme e não o cartaz.

    O ex- cônsul de Israel em Milão e historiador, Pinhas Lapid, teria provado que 860.000 judeus foram salvos por Pio XII durante a Segunda Guerra?

    O senhor Pinhas era um político. Israel na época precisava do reconhecimento do Vaticano e ele divulgou esses números que fizeram todos os historiadores sérios do mundo rirem. O Estado de Israel começava e ninguém o reconhecia, entre eles o Vaticano, que não era favorável à criação deste Estado. Então, os políticos queriam agradar o Vaticano que só reconheceu Israel em 1993, quase 50 anos depois que foi formado.

    Em 1943, o comandante da S.S. em Roma ordenou ao chefe da comunidade israelense fornecer 50kg de ouro num prazo de 24 horas para evitar a deportação de 200 judeus. A coleta só conseguiu reunir 35 kg de ouro. O próprio Pio XII teria complementado os 15 kg restantes. Isso é verdade?

    É falso. A comunidade judaica no início não conseguiu reunir a quantidade de ouro solicitada. Então foi pedido o restante ao Vaticano que disse que ia emprestar com a condição que fosse devolvido um dia. Mas acabou que os próprios judeus conseguiram complementar a quantia.

    Como foi dirigir a Cinemateca Francesa?

    O ministro da cultura Jack Lang me convidou para assumir a Cinemateca Francesa em 1982, depois da vitória de François Miterrand. Ele me deu carta branca para trabalhar e tive problemas, pois encontrei um orçamento anual de apenas US$ 500 mil. Trabalhamos pelo aumento dessa verba e quando deixei o cargo já era dez vezes maior do que isso. Sempre digo: não dá para ter cinemateca sem ajuda do Estado. A primeira coisa a fazer é convencer os governos a financiar, contando também com a iniciativa privada, apesar dela ser mais versátil e nem sempre dispor de dinheiro. É importante o pessoal de cinema se unir e reivindicar, convencendo o governo de que, assim como um museu, o cinema também faz parte da cultura do país. É importante envolver o Estado, criar um fundo para restaurar os filmes e mantê-los numa temperatura ideal, em locais apropriados. Na gestão de Jack Lang, e isso estava no currículo escolar, qualquer criança tinha que ver cinco filmes por ano. Com sua saída, isso não teve continuidade.

    Existem documentos que comprovam a participação dos Estados Unidos nos golpes militares na América Latina, principalmente no Chile, tema de seu filme Missing. O Brasil também teve intensa participação e nosso embaixador Câmara Canto chegou a ser chamado de 5º da Junta Militar - integrada por 4 militares e comandada pelo general Augusto Pinochet. O sr. acha que esse tema está esgotado ou ainda pode revelar muita coisa?

    De uma coisa eu estou certo. Os militares chilenos chamaram “especialistas brasileiros” para ajudar. É o que eu chamo de especialistas da morte. Eu sabia também sobre seu embaixador e da participação ativa dos militares brasileiros, numa espécie de uma “internacional militar”. Os militares chilenos tinham tanto trabalho que precisavam de ajuda. Eu acho que este tema ainda poder revelar muita coisa, sobretudo no Chile onde está tudo parado por causa da presença do general Pinochet e dos oficiais que não querem ser julgados como criminosos de guerra, por crimes contra a humanidade.

    Como vê a perspectiva de um presidente de esquerda no Brasil?

    É uma excelente perspectiva. O país já teve muita direita no poder e não se pode dizer que vive os melhores momentos, apesar de ser um país rico em recursos naturais e humanos. Existe muita pobreza, miséria e problemas. É hora de experimentar alguém de esquerda no Brasil, talvez tenha um desempenho melhor, que acredito que seja melhor.

    Lula está preparado?

    Por que não estaria preparado? Os militares por acaso estavam preparados? Tudo mundo os aceitou. Lula é um homem bem sucedido na política desde que começou, fazendo coisas formidáveis. Por que não conseguiria ser bem sucedido na presidência?

    Qual seria sua mensagem para os brasileiros?

    Eu gosto muito do Brasil e minha mensagem seria de torcer para que tudo se ajeite, que não tenha mais miséria e que tudo caminhe bem. E que Lula seja eleito.

    Outubro de 2002 Entrevista concedida a Ricardo Rabelo, editor do Bafafá On Line.



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