Ao lado da mulher, ícone do movimento feminista Simone de Beauvoir, o filósofo Jean-Paul Sartre passou dois meses e meio no país, e percorreu mais de dez cidades, incluindo Recife, Salvador, Rio, São Paulo e Ouro Preto.
No Rio, Simone e Sartre chegaram a ser fotografados andando na antiga calçada da orla da Praia de Copacabana e suas conferências obtiveram grande êxito.
Já na passagem por Brasília, o casal manteve encontro com o presidente Juscelino Kubitschek, em 22 de setembro de 1960. Na capital, que acabara de se transferir do Rio, Simone e Sartre conversaram sobre o futuro e o desenvolvimento do Brasil.
A maior parte da programação foi organizada pelo casal Jorge Amado e Zélia Gattai, que conheceram Sartre e Simone na França, em encontros do Partido Comunista.
Ao visitar o Brasil, Sartre encontrava-se no auge de sua atuação como crítico da sociedade capitalista e era um influente ativista político. No cenário mundial destacava-se a Guerra Fria, com ameaças de um conflito devastador pelo uso de armas atômicas.
O Brasil e os demais países sul-americanos estavam na rota de interesse das disputas expansionistas, do comunismo da União Soviética de um lado, e do capitalismo defendido pelos americanos. Cuba, que acabara de passar por um movimento revolucionário, estava prestes a se tornar território comunista, tornando eminente o risco de expansão desse regime para os demais países do continente.
A viagem foi um estrondoso sucesso de mídia. Sartre deu entrevistas na televisão, apareceu em colunas sociais, participou de inúmeras conferências e se encontrou com comunistas históricos, como Luís Carlos Prestes e Oscar Niemeyer.
Sartre e Simone visitaram ainda Porto Alegre, São Paulo Belo Horizonte, Ouro Preto, Congonhas, Brasília, Fortaleza, Belém e Manaus.
Destaca-se como uma das mais importantes a visita que fizeram à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara, onde ele proferiu uma conferência dedicada à filosofia. Esse acontecimento resultou numa data memorável para a instituição, para a cidade paulista e um dos eventos mais importantes da vinda do casal para o Brasil.
Simone de Beauvoir representou a mais importante personalidade do movimento feminista em sua passagem pelo país. Seu pensamento a respeito de gênero desenvolve-se a partir da condição da mulher, e suas ideias têm influência do existencialismo de Sartre.
Sua presença em diversas regiões no Brasil resultou num diário em que a escritora registrou suas impressões sobre as cidades brasileiras, os costumes, as misérias e os preconceitos contra a mulher. Esses relatos foram publicados no livro “Sob o signo da história”, lançado originalmente em português em 1965.
Ao longo da visita, Sartre fez grandes elogios ao Brasil e anunciou que voltaria posteriormente como turista, o que nunca aconteceu. Em 1964, as ideias revolucionárias que defendeu seriam sufocadas por um golpe militar.
Sartre disse também que não sabia se sua filosofia sobreviveria a ele. Mas, tal como em todo o resto do mundo, ela influenciou, também no Brasil, gerações futuras de intelectuais, servindo como guia de grande parte do pensamento filosófico brasileiro.
Fonte: Acervo O Globo